domingo, 9 de agosto de 2009

ODE DESCONTÍNUA E REMOTA PARA FLAUTA E OBOÉ: DE ARIANA PARA DIONÍSIO


I


É bom que seja assim, Dionisio, que não venhas.

Voz e vento apenas

Das coisas do lá fora


E sozinha supor

Que se estivesses dentro


Essa voz importante e esse vento

Das ramagens de fora


Eu jamais ouviria. Atento

Meu ouvido escutaria

O sumo do teu canto. Que não venhas, Dionísio.

Porque é melhor sonhar tua rudeza

E sorver reconquista a cada noite

Pensando: amanhã sim, virá.

E o tempo de amanhã será riqueza:

A cada noite, eu Ariana, preparando

Aroma e corpo. E o verso a cada noite

Se fazendo de tua sábia ausência.


Hilda Hilst



Um comentário:

A garota do copo d'gua disse...

Nossa. Eu, como típica ariana que sou, me identifiquei demais com esse texto.
A ariana que sente mais prazer na conquista, no desejo a distântica, no amor ausente, do que na conjugação propiriamente dita.
Aquela que espera por aquele que não vem, e que no fundo nem quer que venha, que se alimenta disso, e disso se lamenta.