"Eu estava semidespido na rede, voltei-me procurando um lençol para me cobrir o corpo - e quando vi ela estava nos meus braços, ou eu nos seus braços - que sei? Era a vida e era a morte, era o abismo, a perdição. A mulher, o perfume, o corpo macio. A paixão, meu Deus. A paixão. Senti que ia morrer e não me importava de morrer. Devemos ter caído os dois na minha dura cama de padre. Nela morremos juntos, os dois. No outro dia ela voltou. E o meu corpo e o meu coração a esperavam. Durante uma semana inteira ela veio, e me parecia uma conjuração provocada por um sonho: a sombra escura que entrava, leve como se não pisasse o chão, o xale preto que caía sobre o ladrilho do quarto - e então era ela, ela, ela. O deslumbramento do amor que eu não conhecia, que eu não sabia assim, que eu ignorava, inocente como uma virgem. Ela que me guiava, me conduzia, me afundava consigo. E, depois de um tempo que parecia absurdamente curto, ela se erguia, se compunha, se envolvia no xale e ia embora..."
Trecho extraído do livro Memorial de Maria Moura, de Raquel de Queiroz. 14º ed. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 2004. pág. 157-158.
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