segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Orgulho e Preconceito


               O post de hoje não teria como não ser sobre o livro Orgulho e Preconceito, da escritora britânica Jane Austen, que completa 200 anos. O livro, na verdade, foi terminado em 1797, mas só foi publicado em 1813.

         A história se passa na Inglaterra, no final do século XVIII, e tem foco na personagem Elizabeth Bennet, uma das cinco filhas de um espirituoso mas imprudente senhor, que tem cinco filhas para “casar”. Naquela época, as possibilidades de ascensão social eram muito limitadas para uma mulher sem dote.

         Elisabeth é uma mulher em que se nota um diferencial em relação às mulheres daquela época e também entre suas irmãs. É uma jovem que consegue enxergar bem além das convenções sociais, tem uma lucidez e discernimento aflorado, e postura crítica. Por seu caráter distinto, Elizabeth desperta o amor de Mr. Darcy.

         O amor dos dois não é aquele à primeira vista. Quando se conhecem, eles não gostam nenhum pouco um do outro, julgando apenas as aparências. Mas ambos estavam errados nesse pré-julgamento, ou preconceito. E tiveram que deixar o orgulho de lado para conhecer o íntimo um do outro.

         Jane Austen tem uma capacidade incrível de mostrar personagens atemporais e é extremamente detalhista neste ponto. Quantos de nós não caracterizamos, ou julgamos, uma pessoa pela nossa primeira impressão? Eu simplesmente amo esse livro, mas não tanto quanto Razão e Sensibilidade, que vale muito a pena ler também.

         E obrigado Jane Austen, por ter nos deixado tamanho legado!!!!

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Caminho Branco


Vou por um caminho branco
Viajo sem levar nada.
Minhas mãos estão vazias.
Minha boca está calada.
Vou só com o meu silêncio
e a minha madrugada.
Não escuto, entre os barrancos,
a voz do galo estridente
que, na treva do terreiro,
anuncia as alvoradas.
Nem mesmo escuto a minha alma:
não sei se ela vai dormindo
ou me acompanha acordada,
se ela é vento ou se ela é cinza,
ou nuvem rubra raiante
no dia que se levanta
como vela desdobrada
em nave que corta as vagas.
Não sei nem mesmo se é alma
ou apenas sal de lágrimas.
Vou por um caminho branco
que parece a Via Láctea.
Só sei que vou tão sozinho
que nem sequer me acompanho,
como se eu fosse um caminho
pisado por vulto estranho.
Não sei se é dia ou se é noite
o que surge à minha frente,
se é fantasma do passado
ou vivente do presente.
Não sei se é a torrente clara
da água que corre entre as pedras
ou se um gavião me espreita
oculto no nevoeiro,
espantalho prometido
ao meu dia derradeiro.
atravessando barrancos
e plantações de tomate
e ouvindo o canto escarlate
de airosos galos polacos,
vou por um caminho branco:
brancura de brumas e prata.
Entre tufos de carqueja
Há constelações de orvalho
E um clarão de meio-dia
cega a minha madrugada.
Vou como vim, sem saber
a razão da travessia.
Nem sequer levo na boca
o gosto da água salgada
que relembra a minha infância
feita de mar e de mangue.
Nem sequer levo nos olhos
- nos meus olhos de menino -
a mancha rubra de sangue
deixada pelo assassino
que vi certa madrugada;
Vou por um caminho branco
e nada levo nem tenho:
nem ninho de passarinho
nem fogo santo de lenho.
Só vou levando o meu nada.
Foi tudo quanto juntei
para oferecer a Deus
nesta madrugada.


Lêdo Ivo

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

William Blake


Veja o mundo num grão de areia,
veja o mundo em um campo florido,
guarde o infinito na palma da mão,
e a eternidade em uma hora de vida!

William Blake

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Não sei quantas almas tenho


Não sei quantas almas tenho.
Cada momento mudei.
Continuamente me estranho.
Nunca me vi nem acabei.
De tanto ser, só tenho alma.
Quem tem alma não atem calma.
Quem vê é só o que vê,
Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,
Torno-me eles e não eu.
Cada meu sonho ou desejo
É do que nasce e não meu.
Sou minha própria paisagem;
Assisto à minha passagem,
Diverso, móbil e só,
Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo
Como páginas, meu ser.
O que segue não prevendo,
O que passou a esquecer.
Noto à margem do que li
O que julguei que senti.
Releio e digo: "Fui eu?"
Deus sabe, porque o escreveu.



Fernando Pessoa

segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Não-coisa



O que o poeta quer dizer
no discurso não cabe
e se o diz é pra saber
o que ainda não sabe.

Uma fruta uma flor
um odor que relume...
Como dizer o sabor,
seu clarão seu perfume?

Como enfim traduzir
na lógica do ouvido
o que na coisa é coisa
e que não tem sentido?

A linguagem dispõe
de conceitos, de nomes
mas o gosto da fruta
só o sabes se a comes.

só o sabes no corpo
o sabor que assimilas
e que na boca é festa

de saliva e papilas
invadindo-te inteiro
tal do mar o marulho
e que a fala submerge
e reduz a um barulho,

um tumulto de vozes
de gozos, de espasmos,
vertiginoso e pleno
como são os orgasmos

No entanto, o poeta
desafia o impossível
e tenta no poema
dizer o indizível:

subverte a sintaxe 
implode a fala, ousa
incutir na linguagem
densidade de coisa
sem permitir, porém,
que perca a transparência
já que a coisa é fechada
à humana consciência.

O que o poeta faz
mais do que mencioná-la
é torná-la a aparência
pura - e iluminá-la

Toda coisa tem peso:
uma noite em seu centro.
O poema é uma coisa
que não tem nada dentro,

a não ser o ressoar
de uma imprecisa voz
que não quer se apagar
- essa voz somos nós.

Poema extraído dos "Cadernos de Literatura Brasileira", editados pelo Instituto Moreira Salles - São Paulo, nº 6, setembro de 1998, página 77.

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

A Perda da Auréola


           "Olá! O senhor por aqui, meu caro? O senhor nestes maus lugares! O senhor bebedor de quintessências e comedor de ambrosia! Na verdade, tenho razão para me surpreender!"
           "Meu caro, você conhece meu terror de cavalos e viaturas. Agora mesmo, quando atravessava a avenida, muito apressado, saltando pelas poças de lama, no meio desse caos móvel, onde a morte chega a galope de todos os lados ao mesmo tempo, minha auréola, em um brusco movimento, escorregou de minha cabeça e caiu na lama do macadame. Não tive coragem de apanhá-la. Julguei menos desagradável perder minhas insígnias do que me arriscar a quebrar uns ossos. E depois, disse para mim mesmo, há males que vêm para o bem. Posso, agora, passear incógnito, cometer ações reprováveis e abandonar-me à crapulagem como um simples mortal. E eis-me aqui, igual a você, como você vê."
       "O senhor deveria, ao menos, colocar um anúncio dessa auréola ou reclamá-la na delegacia caso alguém a achasse."
         "Não! Não quero! Sinto-me bem assim. Você, só você me reconheceu. Além disso a dignidade me entedia. E penso com alegria que algum mau poeta a apanhara e a meterá na cabeça descaradamente. Fazer alguém feliz, que alegria! E sobretudo uma pessoa feliz que me fará rir. Pense em X ou em Z. Hein? Como será engraçado."

Charles Baudelaire