domingo, 29 de novembro de 2009

LIMITES DO AMOR

Condenado estou a te amar
nos meus limites

até que exausta e mais querendo

um amor total, livre das cercas,

te despeça de mim, sofrida,

na direção de outro amor

que pensas ser total e total será

nos seus limites da vida.

O amor não se mede

pela liberdade de se expor nas praças

e bares, em empecilho.

É claro que isto é bom e, às vezes,

sublime.

Mas se ama também de outra forma, incerta,

e este o mistério:

- ilimitado o amor às vezes se limita,

proibido é que o amor às vezes se liberta.

Ele quis morrer para arrasar a morte e voltar.


Affonso Romano de Sant'Anna

domingo, 22 de novembro de 2009

Lóri e Ulisses

"... Mas com Ulisses estava sendo diferente. Ele nunca fora humilde no amor, por deslumbramento, se tornava humilde. Ela não soube como, de joelhos mesmo, ele a tinha feito ajoelhar-se junto a ele no chão, sem que ela sentisse constrangimento. E uma vez os dois ajoelhados ele enfim a beijou. Ele a beijou demoradamente até que ambos puderam se descolar um do outro. Ambos sabiam que já tinham ido longe demais. E ainda sentiam perigo de entregarem-se tão totalmente. Continuaram em silêncio. Foi então deitados no chão que se amaram tão profundamente que tiveram medo da própria grandeza deles. _ Devagar, Lóri, devagar, temos a noite inteira, devagar. Eles pareciam saber que quando o amor era grande demais e quando um não podia viver sem o outro, esse amor não era mais aplicável: nem a pessoa amada tinha capacidade de receber tanto. Lóri estava perplexa ao notar que mesmo no amor tinha-se que ter bom senso e senso de medida. Por um instante, como se estivessem combinado, ele beijou sua mão, humanizando-se. Pois havia o perigo de, por assim dizer, morrer de amor..."
Clarice Lispector

domingo, 15 de novembro de 2009

A VENTANIA


"Assovia o vento dentro de mim.

Estou despido. Dono de nada, dono de ninguém, nem mesmo dono de minhas certezas, sou minha cara contra o vento, a contravento, e sou o vento que bate em minha cara."



Eduardo Galeano

sábado, 7 de novembro de 2009

FRAGMENTO 47

"No desalinho triste das minhas emoções confusas...
Uma tristeza de crepúsculo, feita de cansaços e de renúncias falsas, um tédio de sentir qualquer coisa, uma dor como de um soluço parado ou de uma verdade obtida. Desenrola-se-me na alma desatenta esta paisagem de abdicações - áleas de gestos abandonados, canteiros altos de sonhos nem sequer bem sonhados, inconsequências, com muros de buxo dividindo caminhos vazios, suposições, como velhos tanques sem repuxo vivo, tudo se emaranha e se visualiza pobre no desalinho triste das minhas emoções confusas.
Bernardo Soares