segunda-feira, 29 de junho de 2009

SÚPLICA

Olha pra mim, amor, olha pra mim;
Meus olhos andam doidos por te olhar!
Cega-me com o brilho de teus olhos
Que cega ando eu há muito por te amar.

O meu colo é arninho imaculado
Duma brancura casta que entontece;
Tua linda cabeça loira e bela
Deita em meu colo, deita e adormece!

Tenho um manto real de negras trevas
Feito de fios brilhantes d'astros belos
Pisa o manto real de negras trevas
Faz alcatifa, oh faz, de meus cabelos!

Os meus braços são brancos como o linho
Quando os cerro de leve, docemente...
Oh! Deixa-me prender-te e enlear-te
Nessa cadeia assim eternamente! ...

Vem para mim,amor...
Ai não desprezes
A minha adoração de escrava louca!
Só te peço que deixes exalar
Meu último suspiro na tua boca!...

Florbela Espanca

quarta-feira, 17 de junho de 2009

A PEQUENA MORTE


Não nos provoca riso o amor quando chega ao mais profundo de sua viagem, ao mais alto de seu voo: no mais profundo, no mais alto, nos arranca gemidos e suspiros, vozes de dor, embora seja dor jubilosa, e pensando bem não há nada de estranho nisso, porque nascer é uma alegria que dói. Pequena morte, chamam na França a culminação do abraço, que ao quebrar-nos faz juntar-nos, e perdendo-nos faz por encontrar-nos e acabando conosco nos principia. Pequena morte, dizem; mas grande, muito grande haverá de ser, se ao nos matar nos nasce.


Eduardo Galeano, em O Livro dos Abraços.

domingo, 7 de junho de 2009

Canto II

"No mar tanta tormenta
e tanto dano,
Tantas vezes a morte
apercebida;
Na terra, tanta guerra,
tanto engano,
Tanta necessidade aborrecida!
Onde pode acolher-se
um fraco humano,
Onde terá segura a curta vida,
Que não se arme e
se indigne o Céu sereno
Contra um bicho da
terra tão pequeno?"
Luís Vaz de Camões. Os Lusíadas.